quinta-feira, 8 de março de 2012

Uma mulher entre parênteses

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Era como ela catalogava as pessoas: através dos sinais de pontuação. Irritava-se com as amigas que terminavam as frases com reticências... Eram mulheres que nunca defendiam suas opiniões, que davam a entender que poderiam mudar de ideias dali a dois segundos e que abusavam da melancolia. Por outro lado, tampouco se sentia à vontade com as mulheres em estado constante de exclamação. Tudo nelas causava impacto!!!! Consideravam-se mais importantes que as outras!!! Ela não. Ela era mais discreta. A mais discreta de todas.
Não era do tipo mulher dois pontos: aquela que está sempre prestes a dizer uma verdade inquestionável, que merece destaque. Também não era daquelas perguntadeiras xaropes que não acreditam no que veem e estão sempre querendo conferir se os outros possuem as mesmas dúvidas: será, será, será? Ela possuía suas interrogações, claro, mas não as expunha.
ERA MAMULHER ENTRE PARÊNTESES.
Fazia parte do universo, mas vivia isolada em seus próprios pensamentos e emoções.
Era como se ela fossse um sussuro, um segredo. Como uma amante que não pode ser exibida à luz do dia. Ás vezes, avaliava sua situação com olhos mais românticos e concluía que tudo não passava de proteção. Ela era tão especial que seria uma temeridade misturar-se com mulheres óbvias e transparentes em excesso. A mulher entre parênteses tinha o que dizer, mas jamais aos gritos, jamais com ênfase, jamais invocando uma reação. Ela havia sido adestrada para falar para dentro, apenas consigo mesma.
Tudo muito elegante.
Aos poucos, no entanto, ela passou a perceber que viver entre parênteses começava a sufocá-la. Ela mantinha suas verdades (e suas fantasias) numa redoma, e isso a livrava de uma existência vulgar, mas que graça tinha? Resolveu um dia comentar o assunto com o marido, que achou muito estranho ela reivindicar mais liberdade de expressão. Ora, manter-se entre parênteses era um charmoso confinamento. "Minha linda, você é uma mulher que guarda a sua alma".
Um dia ela acordou e descobriu que não queria mais guardar a sua alma. Não queria mais ser um esclarecimento oculto. Ela queria fazer parte da confusão.
"Mas, minha linda..."
E não quis mais, também, aquele homem entre aspas.

por Martha Medeiros

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